MUBA inaugura palco para talentos musicais da universidade

Por Samira Santos

Entre os dias 9 e 13 de junho de 2025, a Uerj viveu um momento inédito de celebração cultural com a primeira edição da Mostra Uerj de Bandas – MUBA, iniciativa da COART que iluminou o Teatro Odylo Costa Filho com a músicas dos estudantes, servidores e colaboradores da instituição. Com estilos que variaram do jazz instrumental ao metal extremo, passando por música popular brasileira e autoral, a mostra consolidou-se como um espaço de expressão, integração e potência coletiva.

A proposta da MUBA nasceu de um gesto simples, mas revelador: o encontro da coordenadora da COART, Ilana Linhales, com um segurança da universidade que, entre um turno e outro, conciliava sua rotina com a carreira no rap. “Eu pensei: como assim a gente não sabe disso? Quantas potências musicais estão circulando por aqui e a gente não vê?”, relata Ilana. A partir daí, veio o impulso para abrir espaço. “A universidade tem essa obrigação. Não só de formar, mas de dar palco para o que pulsa nela.”

Sem curadoria ou filtro prévio, a MUBA adotou uma chamada aberta e horizontal. “Foi só inscrição e pronto. A gente não queria barrar ninguém. Música é a linguagem de todos”, reforça a coordenadora. Foram selecionadas dez bandas por sorteio que se apresentaram em duplas diárias ao longo da semana, com ingressos gratuitos retirados pelo Sympla – válidos inclusive para horas complementares dos estudantes.

Estreia da MUBA (Foto: George Magaraia)

Destaques do primeiro dia da MUBA: Rock Alternativo e Veteranos do Hard Rock 

O palco da MUBA foi inaugurado com uma explosão de energia no dia 9, trazendo uma mescla de novidade e experiência para o público. Abrindo o evento, a banda Linha 2, diretamente da Zona Oeste do Rio, apresentou seu rock alternativo e autoral. Com influências que passeiam do rock de garagem do The Strokes a Los Hermanos, e incorporando elementos de rap, blues, indie e MPB, o grupo formado por Otávio Oliveira, Tomás Souza, Bernardo Carvalho, João Curty, Luiz Guilherme Lopes e Gabriel Monteiro prometeu e entregou a jovialidade da nova cena do rock carioca. 

Na sequência, a Anjos da Sombra subiu ao palco para celebrar uma década de estrada. Com dois CDs lançados e um histórico de shows em diversas casas de rock, bares, festas e eventos, incluindo circuitos de motoclubes pelo Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, os veteranos Marcelo Silva, Ricardo Freitas e Henrique Silveira mostraram por que são um nome consolidado no cenário, com sua sonoridade hard rock que cativou o público.

Jazz, improviso e juventude – A experiência da Jazz Bras!l

No dia 10, o grupo Jazz Bras!l cativou o público com sua pegada instrumental refinada e vibrante. O quarteto formado por Balthazar Brasil (sax), Lucas Campos (guitarra), Nicolas Vigo (baixo) e Zé Farias (bateria) mistura a tradição do jazz com clássicos brasileiros e muito improviso.

“Nos conhecemos tocando na rua. Depois surgiu a chance de trazer isso pro palco da Uerj e foi mágico”, contou Balthazar, estudante de Geografia. “Tocar aqui foi diferente de tudo. O palco te engole, te desafia.”

O grupo se considera mais um coletivo do que uma banda fixa, como é comum no universo do jazz. “No jazz, a formação é fluida, todo mundo toca com todo mundo. Mas quando a química bate, como bateu aqui, a gente sente que vale manter a formação”, explicou Nicolas.

Eles definiram o palco do Odylo como um “luxo técnico”, comparando com a precariedade de tocar nas ruas: “Aqui a gente ouve nosso som, tem retorno individual. É outra realidade”, disse Lucas.

Quando perguntados sobre a próxima MUBA, a resposta foi direta: “Se tiver, estaremos lá. Com mais história pra contar e mais música na bagagem.”

Apresentação do Jazz Bras!l (Foto: George Magaraia)

O segundo dia da MUBA, foi palco para a banda Capitães de Areia, uma banda que é mais que música, é um autêntico grito de resistência vindo das ruas do Rio de Janeiro. Com uma fusão de rock pesado e funk carioca, o trio formado por Thiago Silva, Gabriela Ferreira e Davi Costa trouxe a potência e a luta das periferias para o público. Suas letras, um retrato fiel das batalhas cotidianas de quem vive à margem, expõem a exclusão social, a violência policial, a corrupção política. A banda incorpora em sua arte a essência do Rio, da favela, e da voz do povo, deixando uma marca inesquecível na MUBA.

Estreias e reencontros – A emoção da Dizemtocando

No dia 11 de junho, a banda Dizemtocando abriu a noite com uma apresentação sensível e energética de músicas brasileiras e autorais. O grupo nasceu entre ex-alunos e um estudante do curso de Psicologia, e teve sua estreia nos palcos justamente na MUBA. Gabriella Silva, Beatriz Lisboa, Marcelo Carmargo e Rafael Vasconcelos falaram com emoção sobre a oportunidade de tocar na universidade onde construíram tantas memórias. A banda nasceu em duas semanas somente com o intuito de tocar na MUBA. 

“Quando a gente se juntou, a química apareceu na hora”, contou Marcelo. “A gente já se conhecia dos corredores da Uerj, do sebo, das oficinas da COART. Mas foi a MUBA que nos uniu de fato como banda.” A estudante Beatriz, que ficou sabendo da chamada pelas redes da COART, completou: “A universidade é nossa casa. A gente precisava devolver pra ela essa música que carregamos.”

No repertório, clássicos da MPB conviviam com faixas autorais como “Paixão é Mar” e “Chefe de Terreiro”. O grupo revelou que ensaiou por dias seguidos, num processo intenso de conexão e improviso. “Ensaiamos tanto que parecia que a banda existia há anos”, brincou Rafael. “Mas foi agora, na MUBA, que a mágica aconteceu.”

Eles já planejam retornar numa possível segunda edição. “Nem que a gente faça o mestrado só pra ter o vínculo e poder participar de novo”, riram.

Final do show do Dizemtocando (Foto: George Magaraia)

A MUBA também foi palco para a apresentação da banda Trevo, formada por três estudantes que compartilham a paixão pela música brasileira. Surgida do encontro entre a sala de música do Cap- Uerj e a sala 10 da COART. Com uma proposta que vai além da performance musical, Trevo celebra a música como elo entre ensino, amizade e arte, criando no palco um espaço de troca sensível e autêntica. Composta por Júlia Nascimento, Bernardo Jurisch e Glauco Silva, a apresentação da banda foi marcada por arranjos delicados, interpretações emocionantes e uma entrega sincera.

Gritos de resistência – A força de Mityma no palco

No dia seguinte, 12 de junho, foi a vez de Mityma, uma banda de Blackened Sludge Metal formada exclusivamente por mulheres, subir ao palco. Com sonoridade densa, letras impactantes e temas como violência doméstica, saúde mental e negligência obstétrica, a apresentação da Mityma foi uma catarse coletiva.

Formada por Isabelle Souza (vocal), Lorena Cepeda (guitarra) e Allanis Faria (bateria), a banda começou com a vontade de ocupar um espaço tradicionalmente dominado por homens. “A gente se jogou mesmo. Não sabia tocar nada, só queria estar lá, fazendo barulho e denunciando com música”, explica Lorena.

Músicas como Doente, Eu Nunca Mais Consegui Dormir e O Vulto de Uma Figura Grotesca Te Implora por Misericórdia causaram impacto pela crueza das letras e o peso emocional das histórias. Apesar de reconhecerem as limitações estruturais da Uerj, como problemas de espaço no curso de artes e salas com goteiras, elas valorizam o papel da COART. “A proposta é linda, é só triste ver como a arte na educação pública é sucateada. Mas seguimos, com força, barulho e poesia.”

Show vibrante da banda Mityma (Foto: George Magaraia)

A segunda banda  foi o Estúdio Mobral que abriu uma apresentação envolvente que combinou sonoridades que evocavam referências como Crumb e Beach House. O grupo, nascido nos becos do Rio, levou ao palco uma performance de cerca de 30 minutos, com Leonardo Santos, Pedro Gomes, Pedro Gonçalves e Paulo Oliveira. 

Já na sexta-feira 13, a banda Ever Rain trouxe a intensidade de suas composições autorais, que transitam entre a melancolia e a força, apresentando faixas do EP More Than Ready e antecipando o novo álbum “Into Ashes”. Formado por Felipe Rodrigues, Matheus Alves e Ricardo Silva Filho, emocionou a plateia com sua composição unica.

Encerrando a noite, a Trash No Star subiu ao palco com sua estética punk lo-fi enraizada no underground dos anos 80 e 90, reverberando influências como Sonic Youth e L7. O trio da Baixada Fluminense, composto por Leticia Lopes, Felipe Santos e Safira Mello, entregou uma performance potente e política, marcada por ruídos, distorções e a vivência de uma banda que concilia a arte com a vida comunitária.

A arte como ponte 

O sucesso da primeira edição da MUBA confirma o que a coordenadora Ilana Linhales defende com veemência: “A arte é uma linguagem universal. Ela revela, transforma, conecta.” Para além das melodias, o evento abriu espaço para vínculos, reconhecimento e resistência.

MUBA em sua resistência no palco do Odylo (Foto: George Magaraia)

“A COART quer isso: não transformar todo mundo em artista profissional, mas dar um lugar de fala, de escuta, de afeto. Que a universidade seja onde as pessoas possam mostrar quem são em todas as suas dimensões”, finaliza Ilana.

Já com expectativas para a segunda edição, a Mostra Uerj de Bandas já se inscreve na memória cultural da universidade como um gesto potente de democratização da arte e um convite para que a Uerj siga vibrando com a pluralidade de vozes que ecoam entre seus corredores.



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